A montanha-russa do autismo
Às vezes demoro mais para escrever um post novo e isso acontece por falta de tempo, falta de inspiração ou dúvida sobre o que e como escrever. É uma grande responsabilidade registrar minhas ideias, sentimentos, anseios, medos e alegrias. De certa forma as pessoas são influenciadas pelo que escrevo e por isso preciso estar atenta para não desabafar demais por aqui. Ouvi uma mãe me dizer neste final de semana que o que ela lê sobre autismo na net é quase sempre tão ruim que ela não fica bem. Por isso preciso partilhar mais os meus bons momentos e aí joguei fora um texto que estava pronto, pois estava “pesado” demais.
Tenho passado maus bocados com minha Milena, ela está agitada e todo mundo tem reclamado, mas depois de uma semana intensa, neste feriado ela ficou tão bem!!! Terá sido um efeito colateral do remédio? Será que a atenção que a Ritalina proporciona está alterando o humor dela? Outra possibilidade foi o fato de termos combinado que não vamos mais pegar nenhum objeto de ninguém. Fui obrigada a voltar atrás e dizer que poderemos trocar. Em dois dias já comprei um lápis (da bic listrado igual ao da Duda) e um creme hidratante que ela viu na clínica ultra super velho… detalhe: perguntei se ela queria um igualzinho, novinho e ela negou categoricamente, preferiu a embalagem usada e gasta.
O fato é que ela está mais calma, mas eu passei mais tempo à disposição dela, dando atenção, sentando para “brincar” (se ela brinca de fazer comidinha temos que arrumar uma comidinha para colocar nas panelinhas, se ela brinca de ônibus temos que colocar cadeiras e se ela diz que vai passear quer que eu abra a porta para ela sair de verdade) e sempre que ela me chamava eu estava disposta a ir onde ela estava. Isso me fez ficar muito mais próxima a ela e talvez tenha sido o fator calmante em sua agitação. Quando eu dou o remédio, ela fica muito calma, atenta, fala baixinho, mas perde a espontaneidade, perde o apetite e horas depois quando o efeito passa, ela fica irritada. Se não dou o tempo de atenção é curtíssimo e sem atenção não há aprendizagem. Eu não sei o que fazer, isso tem me angustiado muito. E a neura da culpa que fica me rondando o tempo todo como faz com toda mãe, fica doida para me atacar.
Os últimos dias tem sido de descida na montanha-russa, mas ao mesmo tempo ela tem estado muito comunicativa. É delicioso ouvir novas palavras como: atrapalhando, espaço e cada vez mais a fala na primeira pessoa. Ontem ela estava vendo filmagens de quando ela era bebê e eu comentei o quanto ela era gostosa, ela respondeu na hora: – eu sou gostosa ainda! E além de demonstrar que está ligada o tempo todo, ela tem tomado cada vez mais iniciativas. Ontem tomou banho “sozinha”, na hora escolhida por ela, com roupa escolhida por ela, quando eu vi ela já estava no banho. Ontem ela pediu para almoçar na minha mãe pelo telefone, eu pensei que minha mãe tinha convidado, mas depois fui confirmar e soube que ela pediu a avó para nos convidar.
Estas conquistas significam muito, ao ouvir uma simples frase: – “ai mamãe, seu pé está em cima do meu, tá me atrapalhando” (nem sei como ela pronuncia isso) esta simples frase demonstra um enorme progresso: ampliação do vocabulário, aumento da consciência corporal, na capacidade de expressar sensações e ainda a vontade em partilhar o que está incomodando. Podem acreditar que houve um tempo em que nada disso acontecia.
Penso que todas as dificuldades que estão em minha vida vem para me ensinar a dar valor às pequenas coisas que a maioria das pessoas nem percebem – inclusive eu mesma. Se no meio do dia ficamos com sede, o ato de nos aproximar de um filtro e ter à mão um copo de água limpa e fresca, beber com prazer e sentir a água descendo pela garganta e hidratando o seu corpo que é uma máquina extraordinária demonstrando que está funcionando bem, deveria ser o suficiente para nos encher de alegria frente a tantas dádivas reunidas em um breve momento. O que fazemos infelizmente, é direcionar nosso prazer para a vontade de dirigir um carro zero, que por melhor que seja passa tão rápido, (um carro é zero por pouquíssimo tempo), possuir uma bolsa de grife que cai logo de moda, ou seja, prazeres materiais que nunca cessam e não trazem nenhuma paz. Os prazeres reais, os milagres diários continuam sendo ignorados até que um evento infeliz vem nos acordar.
Pelo menos isso posso creditar ao Autismo, o fato de ter me tornado tão encantada com os milagres do desenvolvimento infantil e por ter aumentado tanto o meu deslumbramento frente aos pequenos milagres diários que acontecem em minha vida. Com toda certeza, isso não tem preço.
Beijos!!!